Tetris: Blocos de Poder, Jogo de Estratégia Soviético.
Documentário (2023)
Numa época onde a Cortina de Ferro separava o mundo, surge uma história intrigante de como um simples jogo de videogame desafiou o domínio da poderosa União Soviética para conquistar o planeta. Tetris, o fenômeno que transcendeu fronteiras ideológicas, narrando uma saga repleta de conflitos comerciais, batalhas judiciais, crises diplomáticas e até mesmo tragédias pessoais.
O Nascimento do Tetris: Uma Obsessão Matemática.
A história de Tetris começa não nos anos 80, com um programador diante de um computador, mas sim nos anos 70, com um adolescente russo, Alekséi Pázhitnov, com uma perna quebrada e o tédio como companheiro. Imerso em livros e enigmas matemáticos, oferecidos por um amigo que o ajudava a transpor o seu confinamento forçado, onde Pázhitnov encontrou sua paixão, desencadeando uma jornada que o levaria à programação.
Já no início dos anos 80 depois de formado, Alekséi se tornou pesquisador do departamento de computação da Academia de ciência da Rússia. Os jogos eletrônicos já eram um fenômeno cultural pelo mundo afora, menos na União Soviética, que não tinha nenhum interesse neste tipo de distração e se esforçava em mantê-los bem longe de seus domínios.
No entanto, alguns jogos como o famoso Pacman conseguiam passar pelos crivos e alcançar os soviéticos, principalmente os programadores que tinham acesso a computadores. Um destes era amigo de Alekséi, que resolveu estudar o jogo fazendo engenharia reversa e entender como os joguinhos funcionavam em nível de programação.
Alekséi observando aqueles códigos de seu amigo imaginou que poderia criar alguma coisa parecida e logo se lançou em um projeto pessoal, tipo hobby, em desenvolver um jogo baseado em seu amado “pentaminó” , uma espécie de quebra cabeça existente desde a Grécia antiga com doze peças diferentes, que devem ser montados dentro de uma caixa.
Alekséi observou que as peças do pentaminó, formados por um conjunto cinco quadrados seriam difíceis de manipular em seu antiquado computador, assim resolveu reduzir para quatro, em um total de sete peças baseadas em letras do alfabeto.
A genialidade do jogo adaptado por Alekséi para a tela de computador foi criar uma caixa retangular onde a peças caiam do topo e o jogador tinha de manipula-las de uma forma que se encaixarem ao tocar na base. Se não houvesse espaços nas linhas formadas, esta era eliminada, deixando o jogo quase infinito. Com a ideia formada e o embrião do jogo pronto, Alekséi batizou seu invento de Tetris, uma junção da palavra grega tetra (quatro) e o seu esporte favorito, o tênis.
Tetris Conquista o Mundo: Jogadas Arriscadas e Conflitos.
Alguns jogos eletrônicos nos anos 80 eram armazenados e executados através de disquetes, um tipo de pendrive da época. Em 1985 um destes disquetes, com uma versão contrabandeada do jogo consegue atravessar as fronteiras da União Soviética e é exposta no Instituto Húngaro de Ciência da Computação. Foi lá que um comerciante britânico Robert Stein, representante da Andromeda Software, teve contato com Tetris. Ele ficou fascinado pelos aqueles blocos e espantado com o interesse que ele despertava e logo percebeu o potencial do game.
Robert descobriu que a origem do jogo era russa e já sabia que obter os direitos sobre o produto seria um tormento, pois teria que tratar com o estado russo, que mantinha domínio absoluto sobre tudo que o país produzisse.
Mesmo antes de fechar acordo com os russos, através da ELORG, departamento do governo soviético que lidava com a exportação de software, Robert passou a procurar parceiros de licenciamento, como o Mirrorsoft e a Spectrum HoloByte, ambas as empresa de propriedade do poderoso magnata de mídia Robert Maxwell, que venderam esses direitos para outras companhias.
As duas companhias, embora irmãs começam uma batalha comercial. A Mirrorsoft deu os direitos de produzir o game para os Estados Unidos e o Japão para a Atari Games, enquanto a Spectrum dá os direitos de produzir Tetris no Japão para a BPS (Bullet Proof Software), que produz uma versão de Tetris para o Famicom em 1988, vendendo mais de dois milhões de cartuchos, atraindo a atenção de um Minoru Arakawa, o então presidente da poderosa Nintendo.
A Nintendo estava desenvolvendo o Game Boy, um poderoso console portátil e teve a ideia de colocar o Tetris dentro do pacote para garantir mais vendas. Para conseguir os direitos para uma versão portátil dos soviéticos, ele contrata Hank Rogers, o homem por trás da versão para o Famicom do game.
Tetris: A História Cinematográfica e o Drama Fora das Telas.
No filme Tetris, lançado pelo serviço de streaming Apple, Hank Rogers vira protagonista e a história é contada pela sua perspectiva. Casado com uma japonesa e morando em Tóquio, é Hanks que descobre e aposta todas as fichas no Tetris. Arrisca-se viajando para Moscou com um simples visto de turista para tratar de negócios, o que era considerado um crime pelos russos. Lá conhece e torna-se um grande amigo de Alekséi e quer convencê-lo que ele deve ganhar uma coisa com a criação do game.
Apesar de baseado em fatos reais, alguns acontecimentos foram inventados, para tornar o filme mais interessante, como as perseguições pelas ruas de Moscou e a fuga do país, com Rogers como inimigo número um da Rússia. Embora tensas, as negociações tiveram finais sem grandes traumas e todos retornando são e salvos para casa.
Com a dissolução da União Soviética em 1989, Alekséi Pázhitnov emigrou para os Estados Unidos em 1991 e, cinco anos depois, fundou sua própria empresa, a Tetris Company, junto com Henk Rogers e se apropriou dos direitos autorais.
Onde assistir Tetris – O Filme
Os blocos que não se encaixaram na história.
Mas nem toda a história de Tetris foi contada no filme como do programador Vladimir Gerasimov considerado codesenvolvedor do Tetris. Foi ele responsável em adaptar o jogo para o computador pessoal da IBM, quando foi possível adicionar cores as peças e ainda um placar com pontuação.
Quando já morava nos Estados Unidos, logo após ser meio que iludido pelo amigo Pajitnov na fundação da Tetris Company, Vladimir Pokhilko, assassinou a esposa e o filho a marteladas e depois tirou a própria vida em 1998. O crime ensejou a teoria conspiratória de que a máfia russa estaria envolvida na briga pelo jogo — retratada na minissérie documental The Tetris Murders.
Outra história deixada de lado foi a misteriosa morte de Robert Maxwell, bilionário dono de um complexo de empresas de mídia britânica. Maxwell adquiriu os direitos do jogo Tetris e licenciou para a Nintendo, que ajudou a torna-lo um dos homens mais ricos da Inglaterra.
O corpo de Maxwell foi descoberto flutuando no Oceano Atlântico, aparentemente depois de cair no mar de seu iate, embora as circunstâncias exatas da morte permaneçam um mistério. Deixou a empresa com uma dívida e £ 440 milhões faltando no fundo de pensão da corporação. Seu império desabou como um castelo de cartas.
Tetris – uma história com final feliz.
Recentemente o jogo Tetris voltou a ser manchete de jornal, quando Willi Gibson, um adolescente de 13 anos, conhecido na internet como “Blue Scuti”, conseguiu chegar ao score limite do jogo de 999999 e o código do jogo falha e trava completamente. Gibson foi o primeiro ser humano a zerar o jogo original, algo que só uma inteligência artificial tinha conseguido.
O jogo Tetris completa 40 anos em 2024 e não teve um fim projetado. A façanha de Gibson foi tão comemorada porque nem mesmo o inventor do game, Pázhitnov passou horas jogando tentando o título deste jogo viciante que no apesar de tudo, teve um final feliz.